Entrevista concedida pelo professor Sydney Leão, coordenador do Colegiado de Medicina do campus da Univasf de Paulo Afonso
Professor do curso de Medicina do campus de Paulo Afonso e coordenador do respectivo Colegiado Acadêmico, Sydney Leão fala nesta entrevista sobre a preparação dos estudantes durante a graduação na Univasf, a formatura antecipada e a metodologia de ensino aplicada ao curso de Medicina, ofertado em Paulo Afonso. Ele comentou, também, a situação epidemiológica da Covid-19 no baixo São Francisco, a expectativa da atuação profissional dos estudantes egressos da Univasf para a região, entre outros assuntos relacionados ao tema.
Entrevista
Como o senhor avalia a possível atuação desses estudantes que se formarão antecipadamente e, especialmente, como recurso humano no enfrentamento à pandemia?
Apesar da antecipação da colação, tenho certeza, pela excelente formação que tiveram, que os alunos da turma 1 de Paulo Afonso estão plenamente preparados para entrarem na linha de frente do combate ao coronavírus. Devido ao afastamento de muitos colegas médicos, que estão infectados pelo coronavírus ou que fazem parte de grupos de risco (especialmente idosos), existe grande necessidade da chegada desses novos profissionais para o combate à pandemia. Inclusive o artigo 2 da Portaria 383/2020 do MEC assevera que os certificados de conclusão de curso e diplomas, emitidos em razão desta Portaria, terão o mesmo valor daqueles emitidos em rito ordinário.
Qual o perfil desses egressos? É provável que eles passem a atuar, já de imediato, nas unidades de saúde do município de Paulo Afonso?
A turma 1 é composta por 17 mulheres e oito homens; sendo que a imensa maioria deles não nasceram em Paulo Afonso/BA. De qualquer forma, alguns dos discentes e futuros médicos, já expressaram o desejo de regresso à nossa cidade para trabalharem na atenção básica, unidades básicas de saúde ou na atenção hospitalar, nos Hospitais HMPA [Hospital Municipal Haroldo Ferreira] e Nair Alves de Souza.
Como médico e professor de Medicina o senhor avalia que os estudantes que se formam neste momento estarão preparados para atuarem em situação de uma pandemia como atualmente?
Conforme expressado na pergunta anterior, creio que os novos médicos estão preparados para atuarem na linha de frente da pandemia que estamos vivenciando atualmente. Durante o primeiro ano de internato, eles já vivenciaram todas as cinco grandes áreas da medicina – clínica médica; clinica cirúrgica; GO [Ginecologia e Obstetrícia]; pediatria e saúde coletiva, com excelentes notas e até elogios pela performance por parte dos preceptores e supervisores do internato, que é vinculado ao HU da Univasf, em Petrolina.
Qual a situação epidemiológica de Paulo Afonso e do baixo São Francisco para a Covid-19?
Temos até o presente momento, uma pequena quantidade de casos notificados de Covid-19 na cidade de Paulo Afonso, seis casos; e um caso notificado na cidade vizinha de Delmiro Gouveia, já no estado de Alagoas. Não foram detectados óbitos, até o dia de hoje, na região.
Quantas unidades de saúde do município reservaram leitos, intermediários e de UTI – para os casos da Covid-19 e qual a capacidade de atendimento?
A prefeitura da cidade somou esforços com o governo do estado da Bahia para a montagem de uma UPA Covid-19, a qual foi inaugurada ontem (29/04/2020) com quatro leitos de UTI e pretensão de chegar a 30 leitos de terapia intensiva e 100 leitos de enfermaria; estando essa UPA anexa ao Hospital Nair Alves de Souza- HNAS, atualmente vinculado a Chesf e que será o nosso futuro Hospital Universitário da Univasf Paulo Afonso. Existem ainda, na cidade, quatro unidades básicas de saúde que são referência para os casos de baixa complexidade; evitando assim possível sobrecarga do HNAS em relação a casos mais simples de Covid-19.
O curso de Medicina do campus de Paulo Afonso aplica a metodologia denominada Aprendizagem Baseada em Problemas – PBL. O senhor pode discorrer sobre esta metodologia de ensino?
A nossa metodologia (PBL) de ensino foi desenvolvida a partir da década de 70 do século passado na Universidade de Maastrich, Países Baixos; sendo adotada por grandes universidades do mundo nos últimos 50 anos. Inclusive, atualmente ela é preconizada pelas diretrizes curriculares nacionais (DCNs) de 2014, sendo adotada por todos os cursos médicos criados desde então, que é o caso do curso de medicina de Paulo Afonso. Nessa metodologia, os períodos básicos são compostos por uma única disciplina, a qual é dividida em quatro eixos principais, a saber: Habilidades, associados a propedêutica médica e cirúrgica; ATL, associado as disciplinas mais basilares do curso, como anatomia, histologia, patologia, vistas de modo integrado; PIESS, associado a medicina de família e comunidade e conhecimentos em saúde coletiva; e tutoria, eixo teórico do curso, no qual todos os alunos se reúnem em pequenos grupos para discussão de um determinado tema. Todos os diferentes eixos são constantemente integrados, especialmente na chamada ´´Prova integrada“, na qual uma única situação clínica dispara problemas para todos os eixos. No nosso curso, as aulas tradicionais/expositivas são raras; havendo um estímulo contínuo para que os alunos aprendam e produzam o seu próprio conhecimento.
Na sua opinião esta metodologia do curso médico de Paulo Afonso é uma vantagem para a atuação desses egressos neste momento especialmente?
Sim, é extremamente vantajosa; pois desde os primeiros períodos, os alunos são inseridos em situações simuladas ou reais referentes à prática médica; com enfoque à formação do médico generalista, extremamente importante nos tempos atuais para o combate a pandemia.
É a primeira turma de medicina de Paulo Afonso a colar grau, como o senhor avalia este evento associar-se a um evento de saúde pública tão grave e que tem mobilizado iniciativas dessa natureza, e o que representa esta ação também em paralelo a posição do Conselho Federal de Medicina? Existe uma carência de médicos no Brasil, em comparação a outros países de nível similar de desenvolvimento?
Acabou sendo uma coincidência a formatura dos alunos da primeira turma do nosso campus; e das primeiras turmas de outras cinco faculdades de medicina, criadas em 2014 pelo programa mais médicos, terem acontecido justamente agora, no meio dessa grande pandemia. O posicionamento do CFM [Conselho Federal de Medicina] foi de acatar as determinações de antecipação da colação de grau por parte do Governo Federal. Pessoalmente creio que não exista carência de médicos em nosso país; porém seguramente eles estão mal concentrados, havendo grande quantidade de médicos nos grandes centros do nosso país. Isso é evidenciado, indiretamente pela quantidade de médicos existentes, 450.000 e a quantidade de escolas médicas no país, 305 que é a segunda maior do mundo, ficando atrás somente da Índia.
Por Klene Aquino | Jornalista – Seac/GRou