Prefeitura suspende atividades, em decorrência da infecção de servidores pela covid-19
Ex-bailarina, Kátia Rabello é primeira banqueira condenada sem quebrar um banco
Kátia Rabello trocou a vida monástica de bailarina e diretora de companhia de dança, com ensaios de até dez horas por dia, pelo risco de presidir o Banco Rural. Em vez de louros, deve ser a primeira banqueira a ser presa sem ter quebrado um banco.
Acionista do Rural, ela presidia a instituição em 2005, quando ocorreram os empréstimos que o Supremo considerou fictícios e serviram para acobertar o desvio de dinheiro público que alimentou o mensalão.
A condenação de Rabello por gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro coroa uma série de reveses que se seguiram ao mensalão. Ela está com todos os seus bens bloqueados, não pode dirigir instituição financeira e é acusada de ser dona de uma empresa nas Ilhas Cayman.
A “offshore” foi usada para esconder uma usina avaliada em R$ 200 milhões no processo de falência da Petroforte, segundo a Promotoria –ela nega ser dona da “offshore” ou que tenha feita a operação.
Aos 51 anos, mãe de dois filhos, Rabello nunca teve o perfil de banqueiro, segundo seus amigos. Ela estudou biologia até o quarto ano, mas não se formou. Foi para o balé. Não é esnobe, dizem, nem se comporta como socialite.
“Ela é bailarina até hoje. Faz tudo da melhor maneira possível”, diz Suely Machado, 58, que criou com ela uma companhia de dança em Belo Horizonte, em 1982, a Primeiro Ato, e considera-se a melhor amiga dela.
Rabello ficou no grupo até 1995, quando foi cuidar do marketing do banco. Em 1999, teve de substituir a irmã, Junia, que morreu decapitada pela hélice de um helicóptero. Diz, porém, que só chegou de fato à presidência do Rural em 2004, no rastro de outras duas mortes –do pai, Sabino, e do então vice-presidente da instituição, José Augusto Dumont.
A história da bailarina que vira banqueira no curso de tragédias foi apresentada ao STF pelo advogado José Carlos Dias. Ele sustenta que Rabello não participou da negociação dos R$ 32 milhões emprestados ao PT e às agências de Marcos Valério, o que teria ficado a cargo de Dumont.
Rabello estudou dança em Londres no início dos anos 80 e em Wuppertal, na Alemanha, meca da dança-teatro e cidade de Pina Bausch, referência mundial. Teve aulas com Pedro Pederneiras, do grupo Corpo, uma das principais companhias de dança do país. “Não tinha brilho, mas não era uma aberração.”
As opiniões sobre o grupo de Rabello, seguidor da dança-teatro de Pina Bausch, se dividem. “É relevante na cena mineira”, diz Inês Bogéa, da São Paulo Companhia de Dança. Já Pederneiras afirma que “o grupo é medíocre”.
A imagem da bailarina inepta para ser banqueira, sugerida pela defesa, não é completamente fiel, segundo Nelson Carvalho, 66, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP.
Ele foi consultor do Rural em 2005, quando os bancos médios entraram em crise com quebra do Banco Santos.
Carvalho diz ter parte da resposta para a grande dúvida sobre o Rural: como um banco que está envolvido em escândalos políticos desde o esquema PC Farias, em 1992, não foi à lona. É a coragem de Rabello e o conhecimento do chamado “middle market”, o segmento das empresas médias, segundo ele.
Em 2005, após o estouro do caso do mensalão, ele diz ter sugerido que o banco contabilizasse R$ 300 milhões como prejuízo. “Foi a primeira vez que vi um banqueiro bancar o prejuízo.”
A assessoria do Banco Rural diz que os controladores injetaram R$ 750 milhões em 2005 para salvar o banco. A carteira do banco caiu de R$ 5 bilhões para R$ 800 milhões.
A Polícia Federal afirma que ela jantou com José Dirceu, então chefe da Casa Civil, para acabar com a liquidação extrajudicial do Banco Mercantil de Pernambuco, do qual o Banco Rural tinha 22% das ações.
Em março deste ano, a liquidação do Mercantil foi suspensa, e o Rural ganhou R$ 96,3 milhões. O ministro Carlos Ayres Britto diz que foi o Mercantil que levou o Rural a fazer os empréstimos ao PT.
“Ela teve o total desembaraço ao participar de reunião com alto dirigente do Partido dos Trabalhadores”, anotou o presidente do Supremo no seu voto condenatório. Folha