Fixação de penas provoca novo embate entre relator e revisor

 Fixação de penas provoca novo embate entre relator e revisor

‘A minha lógica não é a de vossa excelência’, afirmou Joaquim Barbosa.

‘A minha lógica é a da Constituição’, respondeu Ricardo Lewandowski.

O debate sobre a fixação de penas para Marcos Valério, acusado de ser operador do esquema do mensalão, gerou novo embate nesta quarta-feira (24) entre o relator do processo do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, e o revisor, ministro Ricardo Lewandowski.

Lewandowski criticou o critério adotado pelo relator para estabelecer a pena a Valério pelo crime de corrupção ativa em razão de desvios no Banco do Brasil. Ele afirmou que o critério do relator poderia levar a uma pena “estratosférica”. Barbosa, então, acusou o colega de estar “plantando o que quer colher”.

Após intervalo da sessão, Joaquim Barbosa pediu “desculpas” a Lewandowski pela forma com que discutiu com o colega – foi o primeiro pedido de desculpas após diversos embates. “Eu me excedi há pouco quando rebati de maneira exacerbada o ministro Ricardo Lewandowski, a quem eu peço desculpas pelo excesso.”

Lewandowski disse que o pedido de desculpas de Barbosa revela “grandeza”. “Queria assinalar o gesto de grandeza de pedir desculpa e dizer que aceito-a prontamente. E dizer que nossas divergências não desbordam do plano estritamente técnico e jurídico.”

Relator e revisor já discutiram antes em outros momentos do julgamento. Logo na primeira sessão, em 2 de agosto, Barbosa afirmou que Lewandowski tinha agido com “deslealdade”. O revisor respondeu se dizendo “estupefato” com a acusação do colega. Na sessão do último dia 12, relator e revisor protagonizaram outra discussão. Na ocasião, Barbosa pediu a Lewandowski que votasse “de maneira sóbria”. Depois, eles voltaram a discutir sobre a forma de apresentar os votos sobre condenações e absolvições.

Na sessão desta quarta, o revisor pedia que fosse usada na definição da pena lei anterior à atual, que previa pena de 1 a 8 anos para corrupção ativa. A punição foi aumentada por lei que alterou o Código Penal em novembro de 2003 para 2 a 12 anos.

O relator reafirmou, porém, que o dinheiro foi recebido no dia 15 de janeiro de 2004 e, portanto, o cometimento do crime foi depois da mudança da lei. Nesse caso, para Barbosa, poderia ser aplicada a nova lei.

“Quanto a essa polêmica relativa à data da consumação do delito saliento que a vantagem indevida foi paga no dia 15 de janeiro de 2004. Portanto a conduta ao tempo efetivamente praticada ocorreu sob a égide da lei [que aumentou a pena]. Nenhum dado dos autos permite afirmar que o oferecimento ou promessa da vantagem indevida ocorreu ainda no ano de 2003”, ressaltou.

Durante a discussão, o ministro Luiz Fux sugeriu que Barbosa mantivesse a pena mais elevada, com outra fundamentação que não a pena-base da lei posterior.

Lewandowski, em seguida, afirmou que o réu tem o direito de saber o que motivou o juiz a calcular a pena.

“O réu tem o direito de saber como se deu a dosimetria. Não estamos mais no tempo do Absolutismo”, disse.

O relator disse, então, que diante da “insistência” dos demais ministros, mantinha a pena de 4 anos e 8 meses de prisão, considerando a punição prevista na lei anterior, que estabelece pena base de 1 ano e máxima de 8 anos.

Diante da manutenção da pena de 4 anos e 8 meses pelo relator, o revisor afirmou que a corte precisa dosar as penas para que o resultado final não seja uma punição “estapafúrdia”.

“Não podemos mecanicamente ficarmos a calcular as penas crime por crime, porque chegaremos a um total estapafúrdio. Temos que ir calibrando as penas com razoabilidade.[…] Vamos chegar a uma pena estratosférica.”

“A minha lógica não é a de vossa excelência”, rebateu o relator em tom alto. Lewandowski, então, disse: “A minha lógica é a da Constituição.” Depois, Barbosa afirmou: “Ele está plantando nesse momento o que quer colher daqui a pouco.”

Marco Aurélio Mello interveio para  evitar que a discussão entre relator e revisor prosseguisse. “Nós precisamos admitir o convencimento alheio.” Depois, o plenário, acabou decidindo pela pena do revisor.

Nova discussão

Após a maioria do plenário seguir o revisor na aplicação de uma pena menor a Marcos Valério, Barbosa disse observar “com desgosto” que, na prática, os réus no Brasil cumprem parcela muito pequena das punições recebidas em condenações.

“Num caso como esse, tenho certeza de que ele não cumprirá mais que seis meses de prisão. São tantos os benefícios”, disse.

O revisor rebateu em tom elevado. “Vossa excelência está sofismando”, afirmou Lewandowski.

“Vossa excelência advoga para eles?”, questionou Barbosa. “Vossa excelência faz parte da Promotoria?”, rebateu Lewandowski.

O presidente do Supremo, Carlos Ayres Britto, interferiu dizendo que nenhum dos ministros faz parte da defesa ou da acusação, são juízes.

“O que eu não posso admitir é que me imputem a acusação de ser leniente com alguém que comete crimes graves”, disse ainda Lewandowski.

 G1

 

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