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Sobre Portugal e Fernando Pessoa
Talvez possamos aprender um pouco sobre a vida e a razão de existir com Fernando Pessoa. Ele vem um pouco abaixo de Camões ao lado de quem descansa no panteão dos heróis portugueses. As considerações seguintes aparecem no português de Portugal, e estão baseadas no livro de Antônio Quadros, adquirido em Lisboa em 2014, sobre a obra poética de Fernando Pessoa.
A lírica [de Fernando Pessoa] registra os seus estados de alma na luta cotidiana que travou consigo próprio, um jovem ensimesmado, solitário, introspectivo e melancólico. Ela dá o testemunho lancinante da sua desadaptação à vida social, da sua solidão, da sua angústia, das suas ilusões e desilusões, da sua procura constante de uma transcendência do sentido e do vivido. Segundo Antônio Quadros, com uma tal falta de gente coexistiva, como há hoje, que pode um homem de sensibilidade fazer senão inventar os seus amigos, ou, quando menos, os seus companheiros de espírito? Pessoa sempre duvidou da realidade deste mundo.
A biografia de Pessoa é a sua obra, por ele mesmo considerada uma visitação do alto, e não uma característica psicológica. “Eu cumpro informes instruções de além”. Octavio Paz disse que os poetas não têm biografia.
Fernando Pessoa não concluiu nenhum curso universitário. O Curso de Letras foi um fracasso. Sabe-se que o frequentou por alguns meses, muito descontente com o ensino ali ministrado. Tinha, porém seus momentos de confiança e até de transcendência. “Tenho pensamentos que, se os pudesse concretizar e fazer viver, acrescentariam uma nova claridade às estrelas, uma nova beleza ao mundo e um amor maior ao coração dos homens.” Continua Quadros: “É como se Pessoa aspirasse a um amor ideal, mas se sentisse incapaz de passar da idealidade à realidade. ‘Pudesse-te eu amar sem que existisses/E possuir-te sem que ali estivesses…’”Mais adiante: “Porque só na ilusão da liberdade/A liberdade existe.”
Fernando Pessoa, segundo o autor do livro, também teve os seus momentos de paz, de reconciliação, de fresca, simples e confiada crença em Deus, num Deus-Pai-bondoso. “Deus quere, o homem sonha, a obra nasce.” Mais: “Tudo vale a pena/Se a alma não é pequena.” Lembrando o Brasil de hoje, vejamos o que disse Fernando Pessoa sobre Portugal: “…um Império do Espírito, um Império da Cultura. Para tanto, seria necessário antes de mais nada levantar o moral da nação, abatido pelo complexo de inferioridade em que caímos historicamente.”
Sobre o viver no mundo e sobre o conceito de nação e patriotismo, escreveu, já em 1935, a propósito de Mensagem: “O Indivíduo e a Humanidade são lugares, a Nação o caminho entre eles. É através da fraternidade patriótica, fácil de sentir a quem não seja degenerado, que gradualmente nos sublimamos, até à fraternidade com todos os homens.” O ano de 1935 foi a ano da sua morte. “Até o fim, pensou pois Fernando Pessoa no Encoberto, no Quinto Império, num Portugal salvo da mediocridade e do fulgor baço da sua tristeza, num Portugal, enfim, redimido e restaurado…”
Fernando Pessoa pensou, até o fim, no Portugal “que perdeu a sua grandeza com D. Sebastião, e que só voltará a tê-la com o regresso dele, regresso simbólico […] mas em que não é absurdo confiar”. Pensemos, nós outros, em 2015, no regresso da seriedade no Brasil.
Francisco Nery Júnior