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Em Curitiba, Lula depõe a Moro sobre caso do tríplex
Nesta quarta-feira 10, Lula e Sérgio Moro estarão frente a frente em Curitiba pela primeira vez desde o início das investigações da Operação Lava Jato sobre o ex-presidente. O encontro só não ocorrerá se o Superior Tribunal de Justiça aceitar um dos três recursos apresentados pela defesa do petista para adiar o depoimento.
A primeira conversa presencial entre Lula e Moro no âmbito da operação tratará do processo no qual o petista é acusado de ter recebido propina da empreiteira OAS por meio da reserva e reforma de um tríplex no edifício Solaris, no Guarujá, litoral de São Paulo, em 2009. A defesa do petista nega que as reformas teriam Lula como beneficiário e apresentou documentos nos quais a OAS diz ser dona da unidade 164-A do edifício.
Réu em outros dois casos sob a jurisdição de Moro, o petista já conversou com o juiz no âmbito da operação. Em novembro de 2016, quando o ex-presidente foi arrolado como testemunha de defesa do deputado cassado Eduardo Cunha, Lula e o magistrado chegaram a trocar algumas palavras por videoconferência: o primeiro encontrava-se na sede da Justiça Federal em São Bernardo do Campo e o segundo, na sede do Paraná.
O encontro desta quarta 10 tem assumido contornos de embate, muito pela mobilização de manifestantes favoráveis e contrários à atuação da Lava Jato. A disputa política não se restringe aos cidadãos. Após o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra anunciar uma caravana de 20 mil manifestantes para Curitiba, a juíza Diele Zydek proibiu, na segunda-feira 8, acampamentos em ruas e praças da capital paranaense até às 23h desta quarta 10 e limitou a passagem de pedestres e veículos no entorno da sede da Justiça Federal.
A decisão vale para qualquer manifestante, inclusive aos apoiadores de Moro, grupo do qual a magistrada parece fazer parte. Em seu perfil aberto no Facebook, ela costuma manifestar oposição a Lula e celebrar a chamada “República de Curitiba”.
Não foi tudo. Na terça-feira 9, a Justiça determinou a reintegração de posse de um terreno em Curitiba onde o MST montou um acampamento para aguardar o depoimento do ex-presidente. A área pertence à empresa All América Latina Logística Malha Sul.
Moro negou que o encontro seja um “confronto”. Ele pediu aos manifestantes em favor da Lava Jato que não compareçam para o depoimento de Lula. “Tudo que queremos evitar nessa data é uma confusão e conflito, e acima de tudo não quero que ninguém se machuque”, afirmou o juiz em um vídeo publicado na página do Facebook mantida por sua mulher, Rosângela Wolff Moro.
Marcado para 14h, o depoimento de Lula não deve ser transmitido em tempo real. Moro proibiu a entrada de aparelhos celulares na sala de audiência. O juiz vetou ainda o pedido da defesa de Lula de registrar o depoimento por conta própria. O objetivo dos advogados do petista era captar as imagens de todo o recinto e não apenas do acusado.
Por outro lado, o magistrado determinou uma gravação adicional de imagens do depoimento, “não frontal, mas lateralmente e que retratará a sala de audiência com um ângulo mais amplo”. A gravação em vídeo deve ser tornada pública poucas horas após o fim da sessão.
Conheça as acusações relativas ao caso e o que diz a defesa do petista.
Denúncia do MP-SP
Em março de 2016, Cassio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique de Moraes Araújo, promotores do Ministério Público de São Paulo, apresentaram uma denúncia envolvendo a construtora OAS, o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, e o ex-presidente Lula no caso tríplex no Condomínio Solaris, no Guarujá (SP).
Os promotores chegaram a pedir a prisão preventiva do ex-presidente por falsidade ideológica e lavagem de dinheiro, mas a citação a Lula acabou sendo enviada para Moro.
O processo procurou “apontar as irregularidades perpetradas pela Bancoop quando protagonizou a transferência dos empreendimentos imobiliários para a OAS gerando prejuízos significativos tanto materiais quanto morais a milhares de famílias e, em contrapartida, produzindo atos de lavagem de dinheiro para ocultar um triplex do ex-presidente Lula e da mulher Marisa”.
O trio de promotores virou piada na internet ao confundir o teórico marxista Friedrich Engels e o filósofo alemão Georg Wilhelm Hegel, este último apontado como parceiro de Karl Marx no lugar do primeiro. Marx e Hegel, segundo os promotores, “ficariam envergonhados” diante das “atuais condutas do denunciado Luiz Inácio Lula da Silva”.
Em abril, a denúncia dos três promotores foi rejeitada. A juíza, Maria Priscilla Ernandes Veiga Oliveira, apontou erros no processo e absolveu o ex-tesouro do PT João Vaccari Neto, o empreiteiro Léo Pinheiro e outros dez acusados. Para a magistrada, a denúncia não continha provas suficientes para levar a uma ação penal.
Denúncia de Dallagnol e Powerpoint
Em setembro de 2016, Deltan Dallagnol, procurador da República que integra a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, apresentou denúncia contra o ex-presidente, em parte baseada nas acusações originadas em São Paulo.
Segundo a denúncia, o ex-presidente teria sido beneficiado com desvios de 3,7 milhões de reais em contratos da OAS com a Petrobras para a aquisição, reforma e decoração do triplex e para o armazenamento de parte de seu acervo pessoal quando deixou a Presidência, em 2010.
Em relação ao triplex, Lula é acusado de ser beneficiado com desvios de 2,4 milhões de reais. Outros 1,3 milhão estariam relacionados ao armazenamento de seu acervo.
Na ocasião, Dallagnol não se restringiu ao caso. Na apresentação de sua denúncia em Powerpoint, o procurador apontou Lula como “comandante máximo” e reforçou sua convicção ao expor um slide em que o nome do petista surgia ao centro, circundado por 14 razões pelas quais o procurador considerava o petista o principal beneficiário do esquema.
À época, os procuradores tentaram explicar a ausência de “provas cabais” de que Lula seria o proprietário do imóvel. “Precisamos dizer desde já que, em se tratando da lavagem de dinheiro, ou seja, em se tratando de uma tentativa de manter as aparências de Ilicitude, não teremos aqui provas cabais de que Lula é o efetivo proprietário no papel do apartamento, pois justamente o fato de ele não figurar como proprietário do tríplex, da cobertura em Guarujá é uma forma de ocultação”, afirmou o procurador Henrique Pozzobon, integrante da força-tarefa.
As declarações de Pozzobon, associada a reiteradas declarações de Dallagnol sobre a convicção da Lava Jato sobre a culpa de Lula no caso, acabaram por cunhar a expressão “não temos provas, mas temos convicção”, um bordão usado com frequência por críticos da operação comandada por Moro.
Os argumentos da defesa de Lula
Desde que o caso triplex veio à mídia, Lula tem reiterado não ser proprietário do imóvel. Segundo a defesa, a ex-primeira-dama Marisa Letícia tornou-se associada à Bancoop, Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo, e adquiriu uma cota em um edifício então chamado Mar Cantábrico. A cooperativa separou um imóvel para Dona Marisa, uma unidade diferente daquela apontada pela Lava Jato como benefício indevido ao ex-presidente.
Em 2009, com a incorporação do empreendimento pela OAS, Marisa desistiu da compra e parou de pagar as mensalidades da Bancoop. A unidade foi adquirida por outro proprietário, aponta a defesa. Em 2014, Lula e Léo Pinheiro, diz a defesa, visitaram o triplex “pela única e última vez”. Por considerar que o negócio não interessava à sua família, ele teria desistido da compra.
Em 19 de abril, a defesa do ex-presidente apresentou documentos de recuperação judicial da empreiteira OAS em que a empresa afirma ser a proprietária do tríplex do Condomínio Solaris. A unidade 164-A do condomínio aparece listada em uma avaliação de bens e ativos da empresa em ação que corre desde setembro de 2015 na 1ª Vara de Falências de São Paulo. Nela, duas unidades do Solaris são arroladas como ativos da empreiteira.
A defesa arrolou 87 testemunhas para depor no caso. O alto número de convocados irritou Moro, que chegou a exigir de Lula a participação em todas as audiências. Posteriormente, a Justiça acabou por dispensá-lo da obrigação imposta por Moro.
Depoimento de Léo Pinheiro
Em depoimento a Moro, Léo Pinheiro afirmou em 20 de abril que o “triplex era de Lula” ao ser questionado por Cristiano Zanin Martins, advogado do petista, se o réu entendia que deu a propriedade do apartamento ao ex-presidente. “Desde o dia que me passaram para estudar os empreendimentos da Bancoop já foi me dito que era do presidente Lula e sua família e que eu não comercializasse e tratasse aquilo como propriedade do presidente”, afirmou.
Em depoimento recente, Pinheiro teria afirmado ainda que o ex-presidente o orientou a destruir provas do pagamento de propina ao PT. A sugestão teria ocorrido em uma conversa em 2014, dois meses após o início da Operação Lava Jato. Lula, diz o empreiteiro, quis saber se a OAS pagava propina ao partido no Brasil e no exterior. Ao saber que os pagamentos seriam feitos no País, sugeriu a destruição de provas. Pinheiro, condenado a 26 anos de prisão por Moro, não esclareceu se acatou a sugestão.
O ex-dirigente da OAS, preso há mais de um ano, enfrentou dificuldades para fechar um acordo de delação premiada, justamente por ter se recusado a incriminar Lula. Em nota, a defesa de Lula voltou a atribuir a propriedade da unidade à construtora (leia trecho a seguir):
Segundo Léo Pinheiro, Dona Marisa teria a intenção de passar as festas de fim de ano de 2014 no apartamento, e perguntou quando a obra ficaria pronta. Léo Pinheiro não sabe dizer se o apartamento ou chaves foram entregues para a família do ex-presidente.
Mas os advogados do ex-presidente apresentaram um documento financeiro chamado emissão de debênture, emitida em 2013, que coloca esse apartamento como garantia de financiamento da obra, assinada por Léo Pinheiro, algo só possível de ser feito com o apartamento sendo propriedade da OAS Empreendimentos.
O empresário, então, afirmou que não consultou o ex-presidente antes de emitir o papel. A Defesa de Lula apontou também que o imóvel consta no processo de recuperação judicial da OAS como ativo da empresa, ou seja, continua sendo da OAS.
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