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Delmiro e a reinvenção do Sertão
Nascido no Ceará, Delmiro Gouveia cresceu no Recife do século 19, então um dos mais importantes centros urbanos e comerciais do Brasil. Um ’incidente emocional’ motivou a fuga de Delmiro do Recife para Alagoas, em 1900
Modernizador do sertão. Rei das peles. Pioneiro de Paulo Afonso. Estas são apenas algumas das denominações recebidas por Delmiro Gouveia (1863-1917). Natural de Ipu, no Ceará, o industrial cresceu no Recife do século 19, um importante centro comercial e cultural não apenas para o Nordeste, mas também para todo o Brasil da época. E ainda que tenha ascendido socialmente na capital pernambucana, foi em Alagoas que Delmiro ergueu o mais ambicioso de seus projetos, a Usina de Angiquinho, a primeira hidrelétrica do país, localizada no município que hoje leva seu nome.
Garoto pobre, Delmiro Augusto da Cruz Gouveia ficou órfão do pai ainda menino. Ao lado da mãe e da irmã, mudou-se para o Recife, onde aos 15 anos – após a morte da mãe – começou a trabalhar. Aos 20, depois de ocupações como cobrador de bonde e despachante, torna-se comerciário e passa a atuar na área de compra e exportação dos chamados “courinhos”, isto é, a pele da cabra e do bode.
Tendo apenas o curso primário, a instrução escolar limitada, no entanto, nunca foi um problema para Delmiro. Dotado de notável inteligência para os negócios, o industrial, legítimo representante do pensamento liberal no Brasil, cria em 1899 um centro de comércio, serviços e lazer no bairro recifense do Derby. Inédito para os padrões da época, o empreendimento reunia em um só lugar mercado, hotel, velódromo e um pavilhão de diversões.
Homem conhecido pelas atitudes empresariais marcadamente à frente de seu tempo, Delmiro também teve uma vida amorosa pouco comum. Não à toa, em 1900 saiu literalmente fugido do Recife, aos ser acusado de rapto de menor, após se apaixonar por Carmela, de 16 anos, filha bastarda do governador de Pernambuco Sigismundo Gonçalves, seu inimigo político.
Foi em decorrência desse incidente sentimental, inclusive, que o industrial acabou vindo parar em território alagoano.
50 anos a mil
Delmiro Gouveia viveu exatos 54 anos. Nesse intervalo de pouco mais de meio século, deixou a infância pobre no interior do Ceará para entrar para a história como o homem responsável por levar a industrialização ao sertão nordestino. Personagem cuja trajetória se confunde com a própria formação do Nordeste moderno, seu legado é pouco ou nada conhecido no país. No ano do centenário da Usina de Angiquinho, seu mais ousado projeto, dois livros ganham reedição – a biografia Delmiro Gouveia – O Pioneiro de Paulo Afonso, de Tadeu Rocha, e o romance O Ninho da Águia – Saga de Delmiro Gouveia, de Adalberon Cavalcanti.
Para saber mais sobre a vida e as conquistas do modernizador do sertão, a Gazeta conversou com o professor Edvaldo Francisco Nascimento, autor do prefácio da obra mais completa já escrita sobre o industrial cearense, e com o cineasta baiano Geraldo Sarno, que levou sua história para o cinema.
“O maior legado que Delmiro deixa é mostrar para o sertão e para o sertanejo que a nossa região é possível e o sertanejo é capaz”, diz Edvaldo Francisco do Nascimento
Do Recife para Alagoas, na trilha dos desafios
Linha do tempo
* 1863 Nasce Delmiro Gouveia em Ipú, no Ceará
* 1868 Após a morte do pai, transfere-se com a família para Goiana, em Pernambuco
* 1872 Muda-se para o Recife
* 1878 Após a morte da mãe, Delmiro, aos 15 anos, começa a trabalhar como cobrador na Brazilian Street Railways Company
* 1881 Delmiro trabalha como despachante em um armazém e algodão. Dois anos depois, já era intermediário entre comerciantes do interior e firmas exportadoras de pele e algodão
* 1891 Delmiro se torna sócio de um inglês num armazém de compra e exportação de couros de cabra e bode
* 1899 Assume a direção da Usina Beltrão, uma fábrica de refino de açúcar. No mesmo ano inaugura no Derby, bairro do Recife, um centro de comércio, serviços e lazer, que incluía mercado, hotel, velódromo e pavilhão de diversões
* 1900 Devido a conflitos políticos entre Delmiro e governantes pernambucanos, o Mercado do Derby é incendiado
* 1903 Delmiro torna-se proprietário da Fazenda da Pedra, no sertão de Alagoas
* 1913 Constrói a Hidrelétrica de Angicos junto à Cachoeira de Paulo Afonso para fornecer energia para qa fábrica de linhas de costura que inaugura no ano seguinte
* 1917 Delmiro morre assassinado na varanda de sua casa, em Alagoas