Bebeto não sorria

 Bebeto não sorria

Não me lembro ter visto Bebeto sorrir. Fui algumas vezes à sua loja de motos para um conserto qualquer na minha velha CG 125 de carroceria alta. Conversei longamente com ele no condomínio onde morava na festa de aniversário das duas princesas de Marquinhos, Chefe de Gabinete do IFBA (como a minha moto atual é de 2013, só tem 600 km rodados, há um bom tempo não via Bebeto). Estou agora a curiar da esquina da minha casa no BNH à espera da passagem do seu esquife para acompanhar a procissão até o cemitério. Bebeto, nas conversas, estava sempre compenetrado a tratar de investimentos. Ele sabia que investimento produtivo bota todos para a frente. Quando o indivíduo cresce, toda a comunidade cresce com ele. Ainda não inventaram nada melhor se não considerarmos as benesses eternas.

Mas teria o nosso Bebeto, que os mais velhos todos vimos criança, que se impôs como empresário de sucesso, que era sisudo por ser, razão para sorrir? É certo que sorrir é terapêutico, e garanto que os mais próximos dele o viram sorrir à boca larga. Eu só disse que não o vi sorrir.

Sorrir pressupõe felicidade e concordância; excetuando as vezes em que sorrimos por ironia. Como sorrir em concordância quando:

1)você tem que brigar para ganhar batalhas para a comunidade. O que mais chateava o general George Patton Jr., um dos melhores generais americanos na guerra contra Hitler, era ter que lutar para o deixarem ganhar batalhas para o povo amante da democracia. Patton fazia diferença porque brigava para, primeiro o deixarem lutar e, segundo, para conseguir dos seus superiores o necessário apoio. Se o leitor quiser arborizar a cidade, se quiser montar uma espetacular campanha de operação de catarata, organizar melhor o trânsito da cidade, movimentar o turismo para gerar divisas, manter as ruas limpas, gerar empregos, prover bem-estar, o leitor vai ter que se humilhar, mendigar, correr atrás e insistir;

2)você, no grupo de que você faz parte, vê as mais mesquinhas técnicas de domínio, anulação de oposição e aparelhamento  serem competentemente – para não dizer diabolicamente – aplicadas. Onde mais se fala de amor, você [no caso eu], mesmo levando em consideração ser o pior do grupo [ainda como é o meu caso], é aí que você recebe os golpes mais cruéis. O leitor sabe que está escrito que os filhos das trevas são mais astutos que os filhos da luz. É assim que está escrito;

3)você vê os grupos ou nações se isolando, as confederações se esfacelando, ao invés de se unirem para o bem comum da mesma nação e da humanidade. A lógica seria a união cada vez maior para a cooperação. Para não cansar muito o atento leitor, apenas o convido para considerar que o mundo estaria muito melhor se o horror de dinheiro que é gasto em armamentos bélicos fosse empregado para o bem-estar e a felicidade das pessoas;

4)você é testemunha do esfacelamento da família, da escola e da igreja. Quando escanteamos esse tripé, fortalecemos o processo de apodrecimento da sociedade. Valorizamos mais a pândega do que a família, damos mais valor aos shows do que à escola e desprezamos mais a igreja do que os clubes e as sociedades seculares;

 

5)você nem sempre vê os recursos arrancados avidamente do contribuinte serem empregados para o desenvolvimento. Você vê uma imensa parte desse montante se diluir no pagamento de juros da dívida interna que cresce descontroladamente.

Leitor, leitor, vá me desculpando estar lhe incomodando com esses arrazoados. Mas eu sei que, lá no âmago do seu ser, você gosta. Você é responsável e, eu sei muito bem disto, gostaria de viver em um mundo melhor.

Ouço alguma zoada da caravana fúnebre e tenho que parar por aqui; vestir a roupa e acompanhar o nosso já saudoso Bebeto no último ato da sua vida – a morte.nery

Francisco Nery Júnior

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