E o médico surtou

 E o médico surtou

Aconteceu em Brasília. Aconteceu a míseros quilômetros dos palácios dos poderosos do momento. Aconteceu no Hospital de Base, aquele mesmo onde Tancredo Neves iniciou o seu calvário final. O médico de plantão pirou! Um médico sobrecarregado pirou, senhores leitores. Foi-lhe dada licença de um mês. Um médico pirado, evidentemente, não pode atuar. Ele está ali para salvar vidas; não para matar. Se numa emergência o médico está pirado, o atendimento que ele pode oferecer é um atendimento de risco; de alto risco. Ele pirou com a sobrecarga de trabalho a que foi submetido. Pirou, gritou e esperneou e, pasmem, quase foi preso por falta de atendimento e desacato aos praças da Polícia Militar de plantão no Serviço de Atendimento.

As prisões de Brasília, que deveriam hospedar os corruptos solapadores do nosso desenvolvimento, quase receberam, no lugar daqueles, um médico estressado por falta de um colega que o pudesse render. A diretora confirmou o déficit de pessoal do hospital que dirige. Confirmou a falta de remédios e equipamentos. Enfim, confirmou a completa falta de condições básicas para um hospital de emergência funcionar na capital da República.

Vinha ainda no meu caminho para o trabalho hoje pela manhã. O rádio ligado, ouvi que uma senhora no Rio Grande do Norte corre o risco de ficar cega porque o hospital onde procurou ajuda – para onde iria ela? – não tem nos seus estoques um colírio elementar.  Nesse caso, a família apertou o cinto, diminuiu o prato, e comprou o medicamento. E quem não tem família? E quem a família dele depende para sobreviver? Onde o conceito de solidariedade, dever e retorno do Estado? Onde os princípios tão bem elaborados na Constituição Cidadã de 1988?

Como o médico do primeiro parágrafo, muitos estão a surtar. O leitor que se prepare porque o que vamos ver daqui pra frente é uma série de surtos. É o que podemos fazer: podemos surtar; vivenciar o pipocar de surtos em série.

Quem não se preparou para a época das vacas magras tem que surtar. Quem apenas sorriu enquanto a água invadia sorrateiramente os porões do navio agora só pode surtar.

Apenas lamentar a triste sina dos brasileiros de esperança a esperança a surtar…

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Francisco Nery Júnior

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