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OAB não é auxiliar do governo nem braço da oposição, diz Marcus Vinicius
O presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, declara em entrevista ao jornal Correio Braziliense de domingo (18/10) que a entidade vai estudar tecnicamente se a presidente Dilma Rousseff (PT) cometeu crime de responsabilidade ao liberar as chamadas “pedaladas fiscais” – atraso nos repasses do Tesouro a bancos públicos, fazendo-os financiar programas sociais.
Na terça-feira (13/10), foram nomeados os membros de uma comissão que deverá analisar a decisão do Tribunal de Contas União que rejeitou por unanimidade as contas da petista de 2014. “Não temos posição prévia declarada, será um parecer técnico”, afirma o presidente da OAB.
Furtado Coêlho nega que a entidade esteja demorando a se manifestar sobre a viabilidade ou não de processo de impeachment contra a presidente. Segundo ele, foi o Conselho Federal que decidiu não se pronunciar até o TCU julgar as “pedaladas”.
Com a votação do tribunal, afirma, chegou-se agora a um fato concreto, “de inegável gravidade”. “A decisão do TCU apresenta um fato novo, mas é importante dizer que a Ordem não pode ser linha auxiliar do governo nem um braço da oposição”, declara ao jornal.
Ele também nega que tenha demorado a agir sobre o tema enquanto era um dos cotados para ocupar cadeira de ministro no Supremo Tribunal Federal. “Em fevereiro, antes de [o ministro Edson] Fachin ser nomeado, em sessão pública, li um discurso dizendo que não renunciaria ao cargo de presidente da OAB sob qualquer hipótese. É a aspiração da minha vida ocupar uma cadeira que foi de Raimundo Faoro, de Seabra Fagundes, de tantos brasileiros. Eu me sinto realizado”, garante.
Leia trechos da entrevista:
Correio Braziliense – A OAB, ao abrir um processo para avaliar a decisão do TCU, se colocou como protagonista deste momento tenso da vida brasileira. O que espera dessa comissão?
Marcus Vinicius Furtado Coêlho – A Ordem tem sido gerida ao longo deste mandato de forma democrática e participativa. Procuro sempre não personalizar as decisões na figura do presidente. Até porque é assim que manda o nosso estatuto. Toda decisão tem que ser colegiada. Na minha opinião, a Ordem não poderia ser comentarista de casos, mas defensora de causas. A Ordem tem que cumprir o Código de Ética da Advocacia, que diz que o advogado não pode comentar casos que ele não conhece, que ele não funciona, que outros advogados atuam. Como o presidente da Ordem poderia descumprir o seu Código de Ética? Mas somos defensores de causas, como a Lei Anticorrupção. Fomos nós, após a manifestação de junho de 2013, que demos vazão institucional às reclamações da população. Fomos ao Congresso e vimos que, no Senado, estava parado, há cinco anos, o projeto de Lei Anticorrupção. Isso foi aprovado uma semana depois da nossa visita.
Propusemos há cinco anos, na gestão de Ophir Cavalcante, uma ação direta de inconstitucionalidade contra o financiamento de campanha por empresas. Como também propusemos a criminalização do caixa 2 de campanha, que é a mobilização que vamos lançar agora no dia 22 no Rio. Queremos que o Congresso criminalize o caixa 2. O fim do financiamento de empresas não é suficiente, temos de criminalizar o caixa 2. Estamos apoiando projeto que prevê o fim da contribuição por quem exerce cargo comissionado. Assim como empresas que têm contrato com o poder público não podem doar — fica muito tênue a linha que separa o lícito do ilícito —, os cargos comissionados não devem doar.
Correio Braziliense – E sobre o impeachment de Dilma?
Marcus Vinicius Furtado Coêlho – O impeachment é também uma causa a ser avaliada. Em abril deste ano, pautei o tema na sessão plenária da OAB. Pedi um aconselhamento sobre o que fazer, afinal, é um tema que a sociedade comenta e os jornais brasileiros falam sobre isso. A Ordem tinha de ter uma manifestação, ela não pode ficar omissa.
Correio Braziliense – A OAB sempre puxou vários movimentos, caso Collor, das Diretas, mas, neste momento, ela não está a reboque?
Marcus Vinicius Furtado Coêlho – Em abril pautei o tema. E o plenário decidiu que, até aquele momento, não havia comprovação de um crime praticado pela presidente. E foi unânime a decisão. A decisão dizia que até que sobreviesse uma decisão do TCU, a Ordem não iria se pronunciar sobre o impeachment. Depois, vem o parecer do TCU, e isso passa a ser um fato novo, relevante, de inegável gravidade. Então, no mesmo dia, reuni por via eletrônica os presidentes seccionais e decidimos criar uma comissão para, no prazo de 30 dias, analisar juridicamente a decisão do TCU. Analisar com profundidade.
Já temos os nomes da comissão e optei por escolher um conselheiro federal por região do Brasil e que não tem posição prévia declarada contra ou a favor. A análise será técnica. A Ordem não pode ser linha auxiliar do governo nem braço da oposição. Não podemos deixar a Ordem ser instrumentalizada. Avaliaremos os aspectos do acórdão do TCU. Decorre crime da presidente? Se decorre, enquadra-se na Constituição? Se enquadra-se na Constituição, é caso de impeachment? A Ordem irá se posicionar, não ficaremos omissos. O próprio presidente da OAB na época do caso Collor, o Marcelo Lavenère, manifestou-se publicamente. Ele compreende que este caso da presidente é diferente do Collor por não ter prova de crime praticado. Mas a OAB não vai analisar politicamente. Isso é papel do Congresso.
Correio Braziliense – A OAB não demorou demais para se posicionar sobre as “pedaladas”? Alguns adversários atribuíram isso à sua expectativa de ser indicado para o STF.
Marcus Vinicius Furtado Coêlho – Respondo com os fatos e com o tempo. A nomeação do ministro (Edson) Fachin foi em março. A decisão da comissão no sentido de que não era caso de impeachment foi em abril, posterior. O Fachin já tinha sido nomeado e, como sabemos, não há nenhuma vaga à disposição da presidente Dilma para o STF. Se houvesse algum tipo de retaliação, em abril, a Ordem já teria tomado uma posição em outro sentido.
O que veio em relação à criação dessa comissão foi um fato concreto: o TCU decidiu. Até então o que havia? Havia comentários do partido A, do partido B, havia uma decisão que se guardava o resultado do TCU. Qual era o fato concreto? A própria oposição, no caso o ex-presidente FHC, dizia que a presidente era honesta, que não tinha elementos para o impeachment. Não havia qualquer fato. O que agora temos é uma decisão do TCU. Temos dois caminhos: nada a dizer ou dizer algo. Agora, vou ouvir o plenário, que vai dizer se, diante do parecer do TCU, o quadro mudou. Se concluir que é caso de impeachment, vamos apoiar. Se considerar que não é caso de impeachment, a Ordem continuará não defendendo impeachment. É uma coisa simples. A OAB é maior do que seus dirigentes, tem uma história de 85 anos de existência, tem que ser preservada.
Sobre o STF, como todos sabem, aqui mesmo na Ordem, um mês antes, em fevereiro, antes de Fachin ser nomeado, em sessão pública, li um discurso dizendo que não renunciaria ao cargo de presidente da OAB sob qualquer hipótese. É a aspiração da minha vida ocupar uma cadeira que foi de Raimundo Faoro, de Seabra Fagundes, de tantos brasileiros. Eu me sinto realizado. Terminado o meu mandato, quero voltar para o escritório. E ser advogado, que é a profissão que amo.
Correio Braziliense – Ser ministro de um tribunal superior não é o topo da carreira?
Marcus Vinicius Furtado Coêlho – Poderia até considerar essa hipótese num outro momento, mas não enquanto fosse presidente da OAB. Tomei posse para ser presidente por três anos, e foi o que disse um mês antes da posse do ministro Fachin, que foi uma excelente escolha. Tinha compromisso com a classe e meu mandato vai até 31 de janeiro do próximo ano.