Forró com medo do mosquito: na rota do São João, cidades estão em alerta por arboviroses

 Forró com medo do mosquito: na rota do São João, cidades estão em alerta por arboviroses

Há alguns dias, o auxiliar administrativo Eduardo José Bezerra da Silva, 30 anos, busca uma casa para alugar em Senhor do Bonfim, no Centro-Norte da Bahia. O objetivo é abrigar familiares que vão de Salvador passar o São João na cidade. Acontece que o lugar está entre as 104 cidades da Bahia com risco de surto para arboviroses, com índice de infestação predial em 14% – acima de 4% já há risco.

Diante disso, uma das prioridades de Eduardo é achar um lugar longe de focos do Aedes aegypti, transmisor da dengue, zika e chikungunya. “Já teve umas duas casas que olhei e não gostei muito, perto de uns terrenos baldios. Quando faço as visitas, olho logo os reservatórios”, disse. No São João, a cidade que tem 78 mil habitantes chega a dobrar a população, com turistas.

O índice de infestação em Senhor do Bonfim é o terceiro maior da Bahia. Em primeiro vem Vereda, Extremo-Sul, com 18,6%, e depois Wagner, Centro-Norte, com 15,9%.

Também na rota do São João, Ibicuí e Mucugê estão em situação de alerta para as arboviroses. No levantamento do Ministério da Saúde, ambas têm índice de infestação de 3,6% – entre 1% e 3,9% é considerado nível de alerta.

Abaixo de 1%, o índice é considerado satisfatório – nesse nível estão outras cidades com tradição em festejos juninos: Cruz das Almas (0,7%) e Amargosa (0,8%).

Níveis altos

A Secretaria Municipal de Saúde de Senhor do Bonfim informou que há locais onde o índice de infestação chega a 35% na cidade. Apesar disso, segundo a secretaria, neste ano foram feitas 32 notificações de suspeita de dengue, mas todas deram negativo.

“Estamos trabalhando para evitar que uma epidemia assole a nossa cidade, como em 2015 e 2016. Fico alerta e preocupada porque tem cidades que tem 2% de infestação e tem casos até de morte”, disse a secretária Angeli Matos.

Ela informou que já estão sendo realizadas ações em áreas de risco, com dedetizações, visitas às casas e terrenos baldios, além de limpeza de canais e córregos.

Superintende de Turismo em Senhor do Bonfim, Rodrigo Gomes Wanderley disse que o risco de surto “não impacta de forma alguma na realização do evento”.

“O turista pode vir com tranquilidade para cá, que não vai ter problema. Isso [risco de surto] já foi falado em anos anteriores”, comentou, informando em seguida que o São João terá nomes como Geraldo Azevedo e Adelmário Coelho.

O São João oficial na cidade vai de 20 a 24 de junho. Lá ainda ocorre a festa privada Forró do Sfrega, que costuma receber cerca de 15 mil pessoas de 22 a 24 de junho. Dentre as atrações estão Bel Marques, Xand Avião, Jorge e Mateus, Léo Santana e Cavaleiros do Forró.

Para evitar problemas com arboviroeses, a organização informou que “tem realizado trabalhos de limpeza das áreas no entorno da Fazenda, no intuito de evitar a proliferação de larvas do mosquito e fiscalização de espaços e recipientes que possam acumular água”.

“De forma completar, a região em que o evento será realizado, também está dentro da área coberta pela Prefeitura de Senhor do Bonfim, com trabalho de pulverização de agentes que exterminam os mosquitos adultos, os chamados fumacês, bem como ações em domicílios da área”, informa o comunicado do Forró do Sfrega. Ainda conforme a organização, “a produção e a gestão municipal estão discutindo ações conjuntas de conscientização aos turistas”.

Em alerta

Em Ibicuí, no Sul da Bahia, o São João é famoso por conta de festasprivadas, como o Ticomia e o Brega Light. Ambos levam para Ibicuí os principais nomes do forró e costumam ter público diário de 12 mil a 15 mil pessoas. Um dos organizadores do Ticomia, Lourival Dourado Filho, disse que não estava sabendo dos índices de infestação na cidade, mas que “isso não é fator de preocupação”: “A festa vai ocorrer normal”.

Na edição deste ano, o Ticomia terá nomes como Márcia Felippe, Saia Rodada, Mano Walter, Luan Estilizado, Lordão, Flavio José e Léo Fera. Moradora de Ibicuí e frequentadora do Ticomia, a estudante de Nutrição Dalila Oliveira, 24, disse que os índices de infestação na cidade são motivo de preocupação, sim, mas acha que isso não será motivo para pessoas deixarem de ir para o evento.

Com atrações, como Gustavo Lima, Wésley Safadão, Zé Neto e Cristiano, dentre outros, a festa Brega Light informou, em nota, que “está preparada para o São João, principalmente porque a prefeitura de Ibicuí tem feito um trabalho diário de prevenção”.

Coordenadora de Endemias de Ibicuí, Joelma Ferreira Santos informou que não são registrados casos de doenças relacionadas a arboviroses desde o ano passado, e que a prefeitura realizará este mês um trabalho de campo em casas e terrenos baldios.

Para ela, o índice medido pelo Ministério da Saúde “não reflete a realidade do município”: “Sempre fazemos ações voltadas para a prevenção, como palestras em escolas e panfletagem, bem como visitas às casas”.

Sem mosquito no frio

Recém-incluída na rota do São João da Bahia, Mucugê, cidade de pouco mais de 9 mil habitantes na Chapada Diamantina, registrou esse ano 11 casos de dengue, segundo informações da Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab).

De acordo com o secretário de Turismo de Mucugê, Euvaldo Ribeiro Júnior, cerca de 10 mil pessoas devem ir ao São João, de 20 a 24 de junho. Mas, para ele, os índices de infestação não devem ser motivos de preocupação.

“O Aedes aegypti não tolera o frio [de até 6°C na madrugada] e a altitude [de cerca de 1.100 metros] de Mucugê”, disse o secretário, segundo o qual a principal atração do São João será Genival Lacerda e o filho João Lacerca. As demais atrações serão “trios nordestinos”, basicamente compostos por zambumba, triângulo e sanfona.

A Secretaria Municipal de Saúde informou que combate os criadouros do mosquito Aedes aegypti com carros fumacê, aplicação de cal nos entornos dos córregos para impedir proliferações.

Realiza, ainda, notificações por conta de entulhos pela cidade, carros e terrenos abandonados e cobra a eficácia nas limpezas, além de promover palestras nas escolas, caminhadas e distribuição de panfletos. Agentes de endemias também passam nas casas e fazem bloqueios quando necessário.

Coeficiente de Incidência

De acordo com a Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab), há 75 municípios da Bahia com alto risco de surtos ou epidemias de dengue. Mucugê, que tem coeficiente de incidência de 119, se enquadra entre as 50 cidades no estado com médio risco. Senhor do Bonfim e Ibicuí não estão na lista do coeficiente de incidência, indicador do Ministério da Saúde que mede o risco de adoecimento da população.

Quanto às arboviroses, e especificamente para dengue, o ministério recomenda um recorte desse indicador para estimar a probabilidade de surto e epidemias.

No recorte do Ministério da Saúde, o coeficiente de incidência abaixo de 100 casos por 100 mil habitantes representa baixo risco para ocorrência de surtos/epidemias; entre 100 a 299, médio risco; acima de 300, alto risco.

A Bahia, segundo a Sesab, possui 75 cidades para alto risco de surto/epidemias e outros 50 municípios com risco médio. Os demais estão com baixo risco.

O Ministério da Saúde explica que o recorte de coeficiente de incidência serve só para dengue porque, para zika e chikungunya, “a série histórica ainda não permite estabelecer um parâmetro para estimar a probabilidade de ocorrência de surtos e epidemias”.

Ainda segundo o ministério, para que um aumento na incidência de uma doença represente uma epidemia, o diagrama de controle pode ser utilizado como critério na determinação da existência ou não de uma epidemia.

Outros aspectos da realidade local são levados em conta, como a capacidade e estrutura dos municípios para organização dos serviços de saúde, entre outros. Por isso, a avaliação e definição de epidemia é feita pelos gestores locais de saúde. Já o surto “é uma situação em que há aumento acima do esperado na ocorrência de casos ou doença”.

Classificação dos casos

Os números

A Bahia registrou, até 31 de maio, 31.955 casos prováveis: 7.746 casos de “dengue”, 864 de “dengue com sinais de alarme” e outros 4 de “dengue grave”. Há ainda 7.177 notificações inconclusas e outras 16.123 ignoradas, devido a erros de preenchimentos na notificação.

Caso suspeito de dengue – A pessoa que viva ou tenha viajado nos últimos 14 dias para área com transmissão de dengue ou presença de Aedes aegypti, com febre e duas ou mais das seguintes manifestações: náusea, vômito, mialgia, cefaléia, dor retroorbital.

Dengue com sinais de alarme – É todo caso de dengue que, no período de defervescência da febre, apresenta um ou mais dos sinais: dor abdominal intensa e contínua, vômitos persistentes, acumulação de líquidos, sangramento de mucosas, letargia ou irritabilidade, hipotensão postural, hepatomegalia, aumento progressivo do hematócrito.

Dengue grave – Choque devido ao extravasamento grave de plasma, extremidades frias, pulso débil ou indetectável, pressão diferencial convergente, hipotensão arterial, acumulação de líquidos com insuficiência respiratória, sangramento grave.

Mário Bittencourt mario.bittencourt@redebahia.com.br

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