Entrevista com o Secretário de Desenvolvimento Rural, o deputado federal licenciado Josias Gomes

 Entrevista com o Secretário de Desenvolvimento Rural, o deputado federal licenciado Josias Gomes

Secretário de Desenvolvimento Rural (SDR), o deputado federal licenciado Josias Gomes vê como fundamental o investimento na agricultura familiar. “Não tem fábrica ou empresa na Bahia, por maior porte que seja, que empregue um contingente como esse. Com um detalhe: que vivem no campo, produzindo os produtos que consumimos todos os dias”, analisou.

Josias é contrário à liberação deliberada de agrotóxicos. A medida tomada pelo governo Bolsonaro é vista com preocupação. Apesar de entender que a SDR não tem o que fazer, ele diz “lamentar que o pais tenha voltado com esses venenos”.

Durante a entrevista, o deputado licenciado do PT explicou que entende que a campanha Lula Livre é fundamental para libertar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em razão dele ser um preso político. Na sua visão, as manifestações contra os contingenciamentos de verbas na educação seriam vinculadas ao ex-presidente Lula por ele ter sido responsável pela propagação da educação em todo o país. Veja a entrevista completa:

Após passagem pela Secretaria de Relações Institucionais, o senhor assumiu uma pasta mais ligada a Agronomia, sua área de formação. Neste curto período à frente da SDR, já é possível falar de contribuições ou iniciativas da gestão Josias Gomes para o desenvolvimento rural do estado?

Sim. Primeiro quero agradecer a oportunidade que tenho e a agricultura familiar baiana de estar expondo o que há de mais importante na agricultura baiana, que são os agricultores familiares. Estou há 3 meses à frente da secretaria, mas que vinha muito bem conduzida pelo Jerônimo com a equipe que mantive por conta da boa relação e profundo conhecimento que todos têm com a temática. Nesse período nós já conseguimos organizar uma parte de um tema que é muito importante, que é a chamada assistência técnica. De outro lado publiquei um novo edital, que a prática na secretaria é a seguinte: temos dois grandes acordos, que são empréstimos feitos ao Banco Mundial e ao Fida [Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola], que resultam no carro-chefe na assistência da agricultura família. Lançamos dia 5, Dia do Meio Ambiente, um edital de R$ 22,5 milhões para áreas de ecossistemas frágeis e com limitada exploração econômica. Estamos nos desafiando em manter aquelas pessoas ali e desenvolver agricultura e viver daquilo, sem degradar o meio ambiente.

A agricultura familiar ainda é tratada como elemento para a subsistência do trabalhador rural?

De modo algum. Até porque essa ideia é completamente equivocada. O que faltava era alguém que desse condições aos agricultores. Veja, grande parte do que consumimos em casa vem da agricultura familiar, e olhe que somos um pais que pratica a agricultura há 450 anos. Não teve nenhum governo, só agora no governo de Lula, em 2003, que tiramos a agricultura de subsistência para atividade econômica. Os governos de Lula e Dilma [Rousseff], [Jaques] Wagner e Rui [Costa] permitiram que de subsistência passasse a ser algo importante na economia. Hoje na Bahia 2,1 milhões de baianos vivem da agricultura familiar. A renda média é de 2 a 3 salários mínimos. Não tem fábrica ou empresa na Bahia, por maior porte que seja, que empregue um contingente como esse. Com um detalhe: que vivem no campo, produzindo os produtos que consumimos todos os dias.

 

Entre agricultura familiar e o agronegócio, quem merece mais a atenção do Estado nesse momento de crise econômica?

A grande agricultura, a agricultura empresarial, tem seu arranjo próprio, não precisa tanto do Estado. Temos aqui no oeste do estado um exemplo de uma agricultura bem-sucedida com visão larga, que nos ajuda, e queremos aprender com eles no que sabem mais, o manejo econômico correto da agricultura. Nosso agricultor, o de pequenas propriedades, plantam 10, 15 hequitares, sendo maior plantam 300, 400 hequitares. Temos que aprender essas técnicas econômicas, que levam o agricultor a ganhar em escala. Claro que a agricultura familiar depende do poder público, como um estado como a Bahia que tem 670 mil estabelecimentos de agricultura família. Coloque por baixo 3 pessoas, quantas pessoas que vivem direta e indiretamente nisso? O governo tem sido um grande alavancador da agricultura familiar na Bahia.

Como secretário de desenvolvimento rural e filho de agricultores familiares, como o senhor enxerga a atual relação do governo federal com os pequenos produtores?

Eles estão errando porque ideologizaram tudo, tudo virou ideologia, “a agricultura familiar é do PT”… É um erro. Veja, no Nordeste teve um grande crescimento. No Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] colocaram lá um militar. Nada contra os militares, mas colocaram uma política que, no que depender do Incra, os assentamentos, acampamentos de reforma vão para o espaço, não tem nada de política que sustente. No ano passado tínhamos no estado R$ 238 milhões para fazer cisternas de consumo humano, esse ano eles reduziram para R$ 9,5 milhões. Em 2013, para o Nordeste todo Dilma liberou R$ 1,4 bilhão para as cisternas de consumo, agora para todo o Nordeste são R$ 270 milhões, é um descalabro. E é um erro brutal do governo tratar a agricultura familiar com o diapasão político, ideológico, porque está prejudicando um setor que abastece as residências urbanas, quem não consome leite, queijo, a farinha de mandioca, ovo… é um erro, é ser contra um setor importante da economia brasileira.

A bancada do agronegócio declarou apoio ao atual governo ainda na época da campanha. Em que momento os governos petistas deixaram o agronegócio, perderam esse apoio?

Na verdade, sempre tivemos um bom tratamento com o agronegócio. Eu fui o relator da primeira medida provisória que liberou os transgênicos. Viajei o mundo com especialistas contra e a favor, e aprovamos a lei. Tem setores que nos reconhecem como estimuladores da agricultura empresarial, abrimos espaços. Qualquer cultura agrícola, se perguntarem qual a maior produção, você pode chutar o Brasil. É o primeiro ou segundo, de grãos, carne… Você teve nos governos de Dilma e Lula um incentivo, abertura de mercado. Estive na China com o primeiro ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, e vi como abrimos o mercado sem perder o mercado americano, mas abrimos com a China, o BRICS, fizemos muito pela agricultura. Temos discordância em alguns temas, como por exemplo a liberação de agrotóxicos, éramos muito rígidos. Agora você veja, em 6 meses eles liberaram 189 novos produtos, e parte desses nos países de origem não são permitidos o uso agrícola, e Bolsonaro permitiu. Em 14 anos de governo não liberamos 50 produtos, e eles já vão em 189.

Um estudo recente mostrou que 271 cidades baianas possuem 27 agrotóxicos na água. Falando de SDR, o que o governo do Estado poderia fazer nessa situação?

Nesse caso não temos muito controle, a liberação ou não depende do governo federal, do Ministério da Agricultura. Temos muito pouco para fazer, apenas lamentar que o pais tenha voltado com esses venenos. Aqui, quando fazemos feiras de agricultores familiares e destacamos a parte de produtos orgânicos, sem químicos, eles vendem muito, as pessoas já estão se conscientizando de ter produtos sadios. A SDR não tem muito o que fazer. Veja, eu não sou daqueles que acham que não tem de usar. A agricultura é uma atividade que é praticada há dez mil anos, nesses período grandes revoluções aconteceram, a domesticação de plantas e animais, a revolução verde com o incentivo com uso intensivo de adubo para aumentar a produtividade, e a terceira com a dos transgênicos. Temos uma atividade que existe há muito tempo e não foi erradicada a fome no mundo, e quando criticar o uso de agrotóxicos saber que parte é impossível. Como resolver o problema da mosca branca que é uma praga que dá no tomate que acontece há 8 dias de colher? Aí você vai comer o tomate e tem. Mas como fazer para resolver isso? É difícil.

Uma das propostas da segurança no campo é a liberação do porte de armas para a chamada posse justa. Qual sua opinião sobre a invasão de terras por militantes da reforma agrária e como o governo do estado lida com o tema?

Convivemos bem. Veja, o Brasil é um dos poucos países da América do Sul que não fez sua reforma agrária. Bolívia, Guatemala, Peru, todos fizeram e nós não fizemos. É um tema muito espinhoso, pois é muito ideologizado, as ligas camponesas que tiveram origem em Pernambuco foram mais combatidas por querer distribuir terras do que por outras razões. É que de fato resolvemos esse problema da posse da terra no Brasil, e não é brigando. Temos 57 milhões de áreas agrícolas, 10 ou 11 mil com culturas permanentes de cacau e café, o restante de temporárias. Hoje usamos o dobro disso com pecuária extensiva. Se diminuir a área de pecuária sem diminuir o rebanho, você pode incorporar a produção agrícola que está praticamente sendo usada para a pecuária. Temos terras sobrando, não precisa desmatar nada na Amazônia, fazer arranjos, o que não dá é manter terras ociosas enquanto famílias e mais famílias querem produzir. Se tentou sem muito conflito, na Bahia temos 16 anos de governo do PT no estado. Me aponte um conflito de terra. Buscamos o diálogo, e o que for correto vamos apoiar. Essa agenda já vencemos, sou contra ao porte [de arma].

Como o senhor vê o fechamento da EBDA e da Bahia Pesca, órgãos que eram considerados importantes para o desenvolvimento de áreas não urbanas do estado?

A EBDA é uma entidade voltada para a assistência técnica, hoje atendemos 118 mil famílias com a chamada assistência técnica privada, com entidades que contratamos e elas fazem. No auge eles chegaram a 15% dos agricultores baianos, não houve uma perda, foi trocando de nome, e acabou não sendo uma entidade que buscou primor do desenvolvimento da sua atividade-fim. Sem contar que temos muitos técnicos que estão sendo aproveitados, mas não vejo nenhum prejuízo com a modalidade que aplicamos. Já na Bahia Pesca, que era a atividade de fomento, a iniciativa privada já faz muito bem. Somos o estado que temos a maior costa do Nordeste, águas interiores com rios muito piscosos que não exploramos, tanto os rios, quanto em mar. Qual o papel de fomento que a Bahia Pesca teria em estimular as colônias de pescadores, os ribeirinhos, para que pudessem melhorar tecnicamente no setor fundamental? O Peru produz mais peixe que nós, com menos costa. Nossa costa é maior que a deles. Não tenho opinião formada sobre a Bahia Pesca, mas parte do que deveria fazer [ela] não fez.

Apesar de estadia na gestão estadual, o senhor é deputado federal eleito. Tem saudades da Câmara dos Deputados?

Para falar a verdade gosto muito da atividade parlamentar. Vou para o quarto ou quinto mandato, acho que é o quarto (risos). É uma atividade muito importante, mas nesse cenário que está aí, estou muito bem aqui na SDR.

A bancada federal do PT ainda insiste muito no “Lula Livre”, apesar da estratégia ter sido derrotada nas eleições de 2018. O partido está correto em ainda apostar as fichas no mote ou está na hora de renovação do discurso?

O que você chama de modernizar na verdade é o que já fizemos, colocamos para o mundo que no Brasil em pleno século 21 existe um preso político. Quando falamos “Lula Livre”, estamos chamando atenção para um dado de realidade que não pode ser abstraído. Lula foi preso pelo que dizem, e cada vez mais vemos o que era realidade quando o PT começou com a campanha para tornar Lula conhecido como um preso político. Estamos vendo agora, ainda que em conta gotas, as liberações do Intercept Brasil que mostram ao mundo o absurdo que foi a condenação de Lula. Então não temos outro caminho, temos que continuar com a disposição de libertá-lo e deixar ele se explicar. Deltan Dallagnol chegar ao ponto de dizer que não tinha convicção, ele mancomunado com [Segio] Moro… e não vamos aquiescer, queremos Lula realmente livre.

Nas manifestações contra os contingenciamentos nas verbas da educação, a presidente do PT Gleisi Hoffman disse qune também era o movimento “Lula Livre”, que englobava várias reivindicações. Como o senhor avalia isso?

A Gleisi fazer essa fala foi importante. Esse tema ultrapassa, mas refere-se a Lula, que iniciou o processo da ampliação das universidades públicas. A primeira universidade pública do Brasil foi aqui [a Bahia] em 1808 e nós vivíamos com uma única aqui, que é a Universidade Federal da Bahia. O únicos campus que não era aqui era em Cruz da Almas, que Universidade Gederal da Bahia é essa? Agora sim, temos 6 campi por todo o estado. Quando ela fala isso, dá um realce de que realmente foi o Lula que, mesmo sendo uma pessoa que nunca estudou em uma faculdade, interiorizou o ensino, e que criou mecanismos como o Fies e as cotas, por isso houve essa ligação.

Por Lucas Arraz / Mauricio Leiro

Foto: Priscila Melo / Bahia Noticias

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